Sombra quieta, deusa
dos meus ermos,
guardo-te para uma emergência.
Esse de mim que tu habitas
e consolas
abre-me sulcos na alma.
E ri-se.
Sombra quieta, deusa
dos meus ermos,
guardo-te para uma emergência.
Esse de mim que tu habitas
e consolas
abre-me sulcos na alma.
E ri-se.
Agora que não te amo,
posso dizer-te onde te amei:
amei-te ao fundo dos teus olhos
- a fugir
de que me visses -,
aquietado nas cinzas
que tepidamente cobriam
a praia da tua alma.
Jó dormia e acordava, vinha a mãe e Jó dormia, saía a mãe e despertava. Jó sorria, se a via. Ou Jó chorava, se se ia. E a noite longa longa. A não passar. Nem a mãe a dormir nem Jó a nanar. Tem chichi? Tem cocó? Quer maminha? Estava seco, sem fominha, Jó só queria companhia. Mas a mãe saía no oó de Jó. E Jó não queria que ela se fosse, um olho aberto, outro fechado, um meio a dormir, outro meio acordado. Jó via o milagre da mãe. Que a mãe existia se ele chorava, se ele dormia a mãe já não estava. Gostava do jogo da mãe a aparecer. Uaaá, e lá vinha ela, e de cada vez vinha mais desgrenhada. A correr, a correr, e corria por nada, porque Jó lhe sorria e a mãe serenava. E Jó dormia e acordava, a mãe ia e vinha e Jó ia e vinha e a mãe não dormia e Jó não nanava. Gostava do jogo e a mãe não gostava, e Jó não sabia, não sabia de nada. Jó só sabia que a mãe existia se estava acordada. Quando era embrião, ela adormecia e ele dormia sem dar por nada. E agora ela ia e ele ficava. E ele não queria. Ele não queria e por isso chorava.
Onde tu começas, termina o meu cigarro.
Que bom poder apagar-te agora,
esmagar-te agora,
destruir-te agora em cinzas,
e ter-te ainda a fumegar,
lenta, ah tão lenta,
entre os meus dedos viciados.
Acabo de chegar
de onde fui
esquecer-me de ti.
Quem és tu, quem és?
Podiam queimar-te os olhos
os meus beijos, podiam,
e eu ficar com lábios tristes.
Mas como dizer-te depois
a alegria
de te ter estremecida
a ondear sobre o meu peito?
Sabes-me bem,
sabes-me a dentro de ti.
Existes-me
no céu da boca:
onde ficas tu,
porto desta memória
encantada?
Se te dissolvesses em mim, meu amor, e te afundasses nos meus abismos, havias de encontrar um lugar perdido dos dois. Não me vás tão longe, mulher. Ama-me sobre a pele, a pouco e pouco, docemente, na planície do desejo. Se me fosses possível no sangue, meu amor, eu não te amava.