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Jun 09

 Talvez começar com uns versos de Khalil Gibran, estes versos:

"Gritei aos homens:

- Queria ser crucificado!

E os homens responderam-me:

- Porque havia de cair o teu sangue

sobre as nossas cabeças?"

Podes tirar a máscara, que eu não meço a tristeza pelos olhos - os olhos do corpo vêem para fora, e tu estás triste por dentro. Os olhos mostram-te um desfile de mascarados, um Hell Boy a namoriscar um anjo, três odaliscas de harém, os Irmãos Metralha a arrastar as suas pesadas correntes de ferro. Mostram-te como são felizes os outros debaixo dos seus disfarces. E tu achas que não tens isso. É o que os olhos sabem dar, a impressão de que não temos o que os outros têm. Não se deve confiar nuns olhos assim.

Danças. E, contudo, não danças. Se dançasses, não sentirias falta de coisa alguma. Não haveria uma ruína dentro de ti. Cumpres os passos certos de um samba apenas porque os sabes. O samba vem e tu mexes-te, o samba vai e tu ficas-te. Se dançasses, se realmente dançasses, o samba vinha e tu voavas, o samba ia e continuavas a voar. Ias a dançar na rua, se quisesses, e ninguém sabia que ias a dançar.

Os mascarados passam por ti e tu sorris. Achas que sorris. Mas não é verdade. O teu sorriso tem uma sombra, uma melancolia, e não há sorrisos desses. Os sorrisos ou são felizes ou não são sorrisos. Usas uma técnica de sorrir, os músculos de sorrir, e não te apercebes de que nenhum sorriso pode nascer de uma mágoa.

Eu digo que estás triste, mas sei que nenhuma tristeza pode habitar em ti. As tristezas não habitam, coabitam. Trazemo-las para nossa casa, como hóspedes, mas só ficam se nós quisermos. Sentimos a angústia, a raiva, o medo, a amargura, mas não somos isso. Se fôssemos isso, o que seríamos quando não estamos angustiados, enraivecidos, amedrontados ou amargurados? Não é possível ser duas coisas ao mesmo tempo. Ninguém diz: olha, vai ali o ódio, vai ali o medo, vai ali a aflição. Ninguém diz: vai ali a alegria, vai ali o prazer, vai ali a felicidade. És só tu quem vai ali, e levas contigo os hóspedes que quiseres.

Podes optar pela crucifixão, como o louco dos versos de Gibran, e dizer com ele:

"Tive sede

e pedi que me dessem a beber

o meu sangue".

Se é isso que queres, força. Diz com ele:

"Estava mudo,

e pedi que me abrissem feridas

para ter bocas".

Ninguém é obrigado a sentir-se feliz. Que saibas, porém, quem manda em casa. E mandas tu. Sabendo isto, nenhuma tristeza te fará mal. Quando quiseres, abres uma porta e ela vai-se embora. E tu ficas em paz.

publicado por nanferdinan às 18:17
música: Hey Joe
sinto-me: inspirado

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